sexta-feira, janeiro 02, 2015

Amanhã, perdoo-te



Já magoei muito e já me magoaram muito. Sou, por vezes, cercada por sentimentos de culpa, resíduos radioativos que me transformam num monstro que fende os ares, mas que acaba agonizante. Por outro lado, há momentos em que me sinto um bocadinho vítima, um bocadinho Calimero à mercê da aridez e da ingratidão dos outros.Que fardo pesado.
Assim, entrei em 2015 a pensar que as contas não batiam certo e que era urgente acertá-las.  Peguei na lista (longa) dos credores, nomes ordenados por ordem alfabética, e analisei-os um a um. Claro que não estavam todos ao mesmo nível: havia aqueles que pertenciam à categoria está-se mesmo a ver que vou querer juros altíssimos; outros, cujo guião dera uma reviravolta e que, contas bem feitas, teriam ainda de me indemnizar; muitos a quem,  por mais que tentasse, nunca conseguiria saldar a minha dívida e a culpabilidade dos meus atos e, finalmente, os que, doutorados na arte do perdão, aqueles que se limitam a insinuar um amanhã, perdoo-te, mero conforto teórico, exigiriam até ao fim da minha vida encarquilhadas justificações recebidas com o banal sarcasmo - Se soubesses o que perdeste!
E sei. Na generalidade, perdi realmente a oportunidade de ser uma pessoa melhor e assumo uma derrota catastrófica. Em outros casos, porém, ganhei  a certeza de que há quem goste de mim de todas as formas, mesmo que eu não acerte uma que seja.

AMS


sábado, dezembro 27, 2014

Brinde



Mil desejos cumpridos, sonhos não adiados, 
nos olhos o acordar da luz, na alma a vontade 
de içar velas e a trajetória da sorte, eis o que
vos  desejo para o novo ano que  vai desabrochar.
Para mim, talvez  em jeito de versos sem rima, 
o encanto de erguer a taça e de brindar:
saúdo-vos a todos começando por ti!

AMS



sexta-feira, dezembro 26, 2014

Ideal


Chegar até ti foi, outrora, um ideal. Hoje, passou a ser um ideal às avessas. 
Havia em ti, cria eu, um não-sei-quê que me comovia, algo que não se encaixava na habitual estreiteza de espírito, um encanto sem toque de mundanismo, mas sem banalidade. Chegar até ti era suprema aspiração, ainda que eu soubesse que o que nos separava era intransponível.
O tempo, no entanto, desfocou-te. Chegaras, instalaras-te, mas não chegaste a ficar.  É sempre assim: a cada um de nós o seu tempo, a sua vitória, o seu declínio, o seu esquecimento. Chegar até ti não passou de uma ilusão permanentemente adiada. Afinal, também os sonhos acabam por morrer já que tudo é igual a nada e ninguém é igual a si próprio.
Não sei por que razão a tua imagem não passou de irremissível decepção. Não sei, mas sei que não poderia ter sido de outra forma. Talvez que, feitas as contas, chegar a ti não fosse realmente o meu destino.

AMS

quinta-feira, dezembro 25, 2014

Ternura




O mundo de hoje precisa tanto de ternura.

Papa Francisco

quarta-feira, setembro 03, 2014

Poema Aberto




Não quero consentir-me mais raiva,
derrota ou solidão, nem resgatar o tempo
que se foi com quimérica saudade.
Hoje sei-me vestida de efémero tecido,
e nada se confunde - resto-me no que sou,
daí  me recomeço e permaneço.

AMS

sábado, agosto 30, 2014

a z u l




Pinto o regresso de azul

desejando que para lá do azul
                                                haja ainda mais azul.

Depois, 
          agrafo o azul na alma e nos olhos

para poder navegar  
                              em dias de noites cerradas.

                                                                                                                              AMS

sexta-feira, agosto 15, 2014

A ponte



Livre de mim,
De ti,
De nós,
Deixo para trás o estreito rio
Onde, às escuras, barco sem velas,
Nunca encontrava porta ou janelas.

Livre de ti,
De mim,
De nós,
Crio uma ponte que me afasta
Da movediça areia que eu mesma procurei.
Saí de mim, de ti, de nós, e, só assim, me encontrei.

AMS