Sejamos felizes
Sei que há uma não lógica intrínseca na vida que me fascina, atrai, desafia e que acaba sempre por me vencer – sem que, no entanto, eu me sinta derrotada.A vida não pode resumir-se a “isto me basta!”. Isto não me basta! Sim, catalogar-me parece um trabalho fácil - insatisfeita. Inadaptada, dirão alguns, os "certinhos". Será apenas isso? Não! Tento reagir. Tento não ser mais uma na "manada". Tento não ir apenas porque os outros vão. Tento não me esquecer de viver, estando viva.
Por mais que me esforce, sei que não é fácil entenderem-me. Entender-me. Há tantos factores que nos limitam a capacidade de ver as coisas por si. Em si. Aliás, também eu não consigo perceber certas pessoas, certas atitudes. Mas não as ignoro. Nem as condeno. Só não as entendo.
Já tive a veleidade de acreditar que o homem é um ser naturalmente bom. Que, às vezes, descarrila. Feliz ou infelizmente perdi esse dom. Sei que a maldade vive connosco. Sei que basta muito pouco para que nos magoem. Para que magoemos os outros. Basta ignorarmos - por descuido ou intencionalmente - as consequências dos nossos gestos nos outros.
Não é saudável escamotear a sordidez do mundo. Das pessoas. Mas ficar parada ou escondida... não resulta. Há que saber viajar através dos nossos sentimentos com honestidade e com lucidez. Há que ser inteligente e procurar escapar a uma espécie de ingenuidade senil, doentia, e que usamos, frequentemente, como desculpa para determinados comportamentos. Convém saber misturar o riso e as lágrimas, razão e sentimento e - por que não? – ajustar contas com os nossos devaneios, responsabilizando-nos. É bom que saibamos aprender a viver corajosamente com as nossas cicatrizes - sem as esconder. Mundos, todos nós. Planetas que orbitam em redor de uma fonte básica de energia - o afecto.
Por outro lado, e é isso muitas vezes que me perturba, querem-nos por medida igual. Como produtos em série. Não aceitam que sejamos diferentes. Que a nossa alma - sim, porque todos temos uma - se recuse a andar entupida com o lixo das coisas acumuladas… que nos afogam como uma maré de fel.
A arte de bem viver consiste em tirar o maior bem do maior mal - a frase pertence a Machado de Assis. Atrevo-me a acrescentar : A arte de bem viver consiste em saber viver. Viver em paixão com alguém, com o mundo, com alguma coisa, mas, sobretudo, connosco.
Recordo certas palavras que li, algures - “Vê o que mais ninguém vê. Vê o que os outros preferem não ver por medo, conformismo. Vê o mundo de uma forma diferente todos os dias”.
Não estejamos aqui apenas para nos mantermos vivos. Na vida, há capítulos que, inevitavelmente, se fecham. Não adianta voltar a abri-los, pois a leitura seria sempre diferente. Que nos baste saber que já os lemos. Que há mais à espera de serem lidos. Que há mil e um abraços que cabem num só. Que a arte de bem viver é, afinal, reaprender, constantemente, a arte de ser feliz.
Sejamos felizes!
AMS