Silêncios
Tempo lento. O dia morrendo.
Uma mulher vestindo de negro, num banco de um jardim. Um olhar perturbado. Ausente.
Um céu sombrio. A noite chegando.
A mulher parece inerte. Traços vincados. Lágrimas clandestinas. Sem ver. Sem ouvir. Abafando a dor. Amarrada de pés e mãos a um passado que não voltará. A um passado onde havia outra pessoa que a morte arrebatara. Como viver sozinha, quando se viveu a dois durante tanto tempo? Como preencher aquele vazio enorme, confuso, ilógico? Como a morte era traiçoeira! Imoral!
A fixidez do olhar navega, interiormente, de pequeno nada em pequeno nada. O pensamento carimba o que já não existe. O absurdo da perda. O recuo impossível.
Alguém caminha perto. Um vulto aproxima-se. É um homem. Os olhares críticos defini-lo-iam com uma só palavra – pedinte. Ou, ponto de referência obrigatório – vagabundo.
Surpreendido, olha a figura amarrotada, encolhida, dobrada sobre si mesma. Ainda que inconsciente do drama por ela vivido, pára.
- É noite, minha senhora. Sente-se bem? Que aconteceu?
A voz que lhe responde é neutra, maquinal.
- Recordo… é isso… recordo…
Um sentimento de desconforto e, simultaneamente, de partilha, leva-o a insistir.
- Quer que a acompanhe a algum lado? Que chame alguém?
- Não quero nada. Já não vale a pena… Deus esqueceu-se de mim…
Ele não responde. Também sente, às vezes, que Deus se deixa adormecer em momentos cruciais. Ou, então, nem se dá conta da existência de alguns…
Delicadamente, senta-se ao lado da mulher.
E ali ficam os dois, num banco de um jardim, olhos abertos na escuridão, tentando entender por que motivo não obtêm resposta desse Deus de todos, quando suplicam – Estou a precisar de Ti. Lembra-te de mim.
Ainda lá devem estar…
AMS