domingo, julho 02, 2006

Parabéns!

Voltei a lembrar-me de ti. De nós. Da nossa infância, como se ela pudesse ser vivida e revivida sem fim. Não pode. É apenas uma palavra. Simples. Gasta. De todos os dias.
Que nos aconteceu? Onde, quando, como perdemos o afecto que nos ligava? A humildade e a emoção de saber que podíamos contar um com o outro? Quem foi o primeiro a “matar” o outro? A desligar o que nos unia para o resto das nossas vidas? Não existe virtude na bondade se ela assenta num interesse subjacente. Se ela funciona como moeda de troca, isenta de qualquer preocupação afectiva.
Não, não pretendo excluir-me da culpa que me cabe. Além disso, começo a duvidar cada vez mais das minhas apreciações. Dos meus juízos. Dos meus valores. Dou-te a vantagem de uma perspectiva diferente. Talvez tenhas razão - não podemos falar de decência ao falarmos de coisas. Abaixo as razões altruístas! Entre o bem e o mal, quando se trata de investimentos materiais, não há parâmetros exactos. Ou, se os há, são puro desperdício. Predadores e vítimas confundem-se. A nossa dignidade é uma coisa extremamente frágil, começo a concordar contigo. Se, outrora, eu pensasse assim, talvez não me tivesses excluído da tua vida. Talvez não me sentisse uma tonta libélula das palavras. Talvez não me banhasse nesta tristeza, que nada tem a ver com ciúmes ou inveja, e que é tanto mais íntima quanto universal. Talvez eu pudesse ter esquecido que hoje fazes anos. Não esqueci. Apesar de tudo, ainda não consegui entrar no mecanismo do jogo das relações humanas. Porém, aplicar considerações morais a toda esta situação seria mais um equivoco. Não consigo desculpar o teu comportamento, mas também não consigo entender o meu. Sob todos os ângulos, começo a perceber que a razão do nosso afastamento tem a ver com uma premissa muito simples – não sabemos amar. Não sabemos perdoar. Esquecemos, ambos, o sentido da vida.
Tu continuarás a sentir um orgulho paradoxal na superioridade da tua vontade sobre o coração. A tua vida continuará tão tépida quanto os teus sentimentos. Eu continuarei a entabular comigo mesma o negócio dos arrependimentos, perdida, miseravelmente, num comportamento standartizado, estranho e irrespondível. Ambos nos declaramos o direito de ser e de estar. Sós. Irremediavelmente sós, num universo de ruínas e de desesperanças.

Parabéns, Paulo.


AMS