quinta-feira, outubro 19, 2006

Escrever...

Que interesse têm as minhas palavras se, ao invés de nelas me encontrar, nelas me perco? Por que motivo escrevo? - interrogo-me frequentemente. Qual o porquê desta ânsia de encontrar respostas se a vida se resume a pontos de interrogação?
Vamos por tentativas. Como é óbvio, não busco a fama. Muito menos a imortalidade. Tenho perfeita consciência de que não habita em mim aquela chama que molda as grandes almas destinadas à duradoura glória de jamais serem esquecidas. Apenas sentimento e este desejo pueril de valer pelo que sou - eis o que há em mim. Não me iludo. Como eu… há milhares de amantes da escrita. Sim, é esse o rótulo adequado. Será, porventura, por uma questão de solidão (in)voluntária? Uma fuga para não me sentir tão desnorteada nesta nossa efémera passagem? Ai o tempo! Tão serenamente apressado! Tão atentamente indiferente!
Será - quem sabe? - a estratégia que encontrei ao meu alcance para captar a atenção dos distraídos da vida? Tão absortos! Tão alheios ao que os rodeia. Aos que os rodeiam.Tão esquecidos dos outros. Até deles.
Por que razão escrevo, então? Para não me alhear? Para não me resignar, quero dizer, para não perder a ousadia de me revoltar? Para quebrar rotinas - ainda que, paradoxalmente, escrever possa parecer uma rotina? Para não limitar a história da minha vida ao subtil - e contínuo - deslizar diário de vinte e quatro horas?
Escrever será um acto exibicionista? Talvez... De certa forma - não o nego - o acto da escrita implica expor a alma. Todos temos fraquezas. Uns exibem o corpo. Outros desnudam a alma. Sim, sei o que estão a pensar. Em ambos os casos persiste o desejo de tocar de algum modo os outros. Atraindo-os? Chocando-os? Irrelevante. Em ambos os casos há, sobretudo, uma enorme vulnerabilidade. Daí o desapreço. A incompreensão. No fundo, ao falar de mim - ainda que pareça estranho - estou a falar dos outros. Ao falar dos outros... acabo por falar de mim.
Escrever para quê? Não sei. Sei, isso me basta, que as palavras acendem o gesto do que não ouso. Que através delas respiro, simultaneamente, a erosão da realidade e a textura delicada do sonho que me ajuda a sorrir, a acreditar, a não desistir.

AMS