Frivolidades... ou talvez não...
Que mulher não gosta de passar umas horas num instituto de beleza, alimentando o ego, desabafando, levedando tricas e dicas e, finalmente, emergindo com uma nova aura, brilhante e auspiciosa?! Todas. O salão de beleza funciona como uma espécie de templo sagrado e não é apenas uma questão de moda, acreditem. Se para os homens o futebol é uma espécie de hiper-ventilador, já para o chamado sexo fraco a passagem pelo cabeleiro ou pela esteticista funciona como um recarregar de energias, um atalho infantil rumo a uma felicidade vaga e fugaz (sim, é como se contássemos a história do bandido a nós mesmas), uma espécie de termas purificadoras, relaxantes, duradouras qb. O certo é que, nestes locais de embelezamento e de fenómenos mais ou menos “metafísicos”, o tempo parece parar. Senão vejamos: entramos apressadas, com hora marcada no dentista, olhando, constante e ansiosamente, para o relógio como se a nossa cidade tivesse um tempo exacto para ser bombardeada e… zás, como por artes magicas - ou contágio fulminante - esquecemos, de imediato, os compromissos, “vestimos os coletes salva-vidas” , descarregamos os nós cegos atravessados na garganta, lemos as fofocas das revistas de coração, confessamo-nos aos profissionais atentos que nos aturam há séculos – a nós, às nossas mães, às nossas filhas, às nossas amigas…. - e, quando nos apercebemos, já passaram três horas - no mínimo - o dentista já era e a cidade poderia ter sido completamente destruída que nada, mesmo nada, nos faria sair daquela terapia a favor da auto-estima. É uma defesa natural, podem crer! Sem ela, está provado cientificamente, o nosso equilíbrio seria minado e tornar-nos-íamos umas psicóticas em regime de voluntariado.Na última vez que visitei um desses maravilhosos locais, apressadíssima, descontente pelo facto da menina Dolores - prometi que colocava quatro vezes o nome dela, nesta croniqueta, para fins publicitários - ainda não ter“terminado” - não, não disse exterminado - a cliente das 15h, reparei num vulto - outra alma apressada, concluí - que passou, seráfico e fugaz, pela sala de espera. Aquela cara não me é estranha - dei comigo a reflectir. Contudo, nem tive tempo para fazer "sair" o comissário Maigret que existe em todas nós. Pode entrar. Isto hoje atrasou-se. A cliente das 16.30 já está aí - explicou a menina Dolores ( vá lá, ela merece mesmo a publicidade).
Entrei, preparei-me para uma sessão capaz de fazer inveja aos carrascos do Santo Ofício - não entro em pormenores - quando, subitamente, ouço - É ela, pode crer. Também é professora e tem esse nome, sim.
Olho para a porta e… ei-la, a minha amiga e colega. Há quanto tempo! Beijinhos. Que bom ver-te por aqui. Como o mundo é pequeno. Como estás? Onde estás? Já sabias que… Nem me contes… Bem, é escusado tanto blá-blá-blá para se adivinhar a continuação da cena.
Menina Dolores - e já vão três - pode atender a cliente que estava depois de mim. Não me importo. E não me importei mesmo.
A minha amiga - tão apressada quanto eu, pois tinha a filha à espera - passou comigo para uma outra sala e, num curso intensivo, mas altamente profícuo, revivemos tempos passados, familiares, amigos, colegas e tudo o mais que duas mulheres cultas, versáteis - e modestas - são capazes de abranger.
A certa altura, o telemóvel dela tocou. Era a filha, claro. A pobrezinha, cansada de esperar, tentava descobrir o que tinha acontecido. Nada. A mãe vai já. Aliás, já estava de saída. Um “pequenino” atraso.
Beijinhos. Cumprimentos. Adorei ver-te. Que pena estar com pressa. Bem, vou despedir-me da menina Dolores... - e vão quatro!
Resultado: quando a minha amiga saiu, dei-me conta que estava envolta num lençol e… cheia de pressa!
Zé, estou a imaginar a tua cara ao ler este textito. Que frivolidades! Mulheres! - pensarás, abanando três vezes ( sinal de sabedoria, não é assim?) a cabeça. E pensarás bem. Apenas queria acrescentar um pequeno detalhe - a minha amiga, aquela bonita senhora de olhos grandes e esverdeados, fez um levíssimo reparo que talvez te interesse. Passo a citar -“O meu marido, ultimamente, com a mania da Internet, vê lá tu, ainda não arranjou tempo para arrumar a papelada do escritório…”
Será, amigo Zé Almeida, que este desabafo soa um nadinha familiar? Não? De certeza? E se eu acrescentar que ela tem uma filha igualzinha à tua? Não. Decididamente, meu amigo, não é clonagem!
Somos todas iguais, não é o velho slogan? Frívolas! Exageradas! Excêntricas!
Mas temos o encanto da Mary Poppins - digo eu. Se estavam à espera que dissesse que era o encanto da Mona Lisa... enganaram-se! Tornei-me uma céptica compulsiva desde que li que aquele sorriso enigmático e famoso pertencia, afinal, a um homem. O que um instituto de beleza não é capaz de fazer!
AMS