domingo, outubro 22, 2006

Quando era o tempo

Amo-te tanto! - dizias. E eu acreditava.
Não percebendo, na embriaguez subtil da ilusão,
que essa certeza, ritual da presença, fazia com que nunca
me alcançasses, porque nunca me descobriste realmente.
O teu amor - proclamavas - era absoluto. Agora eu penso
que era sufocante. A imagem do próprio desamor.
Uma espécie de cárcere de almas, uma cegueira
do olhar sempre ateada à tua maneira. Insegura.
Centrada em ti como uma etiqueta de identificação.
Nunca te pedi milagres, nem grandes nem profanos,
apenas que me deixasses atingir a sublime simplicidade
de ser eu. Mas tu não conseguias, ou não querias,
distinguir o meu eu do teu eu, como se isso nos
fizesse percorrer, entrelaçados, o caminho um do outro.
Querias-me - ouso acreditar que sim – esquecida
sobre o tempo, o teu tempo, e nunca me pediste
que te explicasse o meu olhar cheio de mágoa
e desamparo. Nem sequer soubeste o que fazer com ele.
E agora faz-se tarde. Já dissemos tudo o que havia de ser
para sempre e, desde então, ficámos sem palavras,
sem gestos, sem silêncios cúmplices. Tudo passou
a ser despropositado e inútl. Faz-se tarde. É inevitável
escrever a palavra fim nesta história já terminada.
Por que esquiva razão não me deixaste amar-te
quando era o tempo? Amei-te tanto!

AMS