sexta-feira, outubro 20, 2006

Quero que saibas

Quero que saibas que, hoje, soltei todos os sonhos - ausentes de mim e tão em mim - o eco estrangulado do sentir, a vontade que me obriguei a calar.

Quero que saibas que, hoje, acordei, uma a uma, todas as letras do alfabeto, parti com elas, voltei com elas, e decifrei-te na claridade exacta das palavras.

Quero que saibas que não é de tristeza o palpitar dessas palavras, mas de serena respiração, de ternura súbita a abrir caminho, acordando outras palavras ocultas, agora livres de dúvidas, de atalhos, de esperas alastradas em manchas de interrogação.

Quero que saibas que, cansada de repousar no ontem, neguei a solidão, espalhando as suas cinzas em tudo o que a ausência espelha.

Quero que saibas que tive medo, que já não é medo, e que encontrei, enfim, outra margem de mim que me diz – a dor escoou. O sonho sobreviveu.

Quero, ainda, que saibas que tenho já no olhar a certeza da chegada, que o longínquo profundo da memória flutua sem sobressaltos, sem tropeçar numa lágrima perdida na clareira íntima da saudade.

Quero, finalmente, que saibas que, mesmo sentindo o teu silêncio e nele a minha lonjura, é para ti que escrevo. Sempre.

AMS